07 fevereiro, 2012

O Valter Hugo Mãe escrevia um dia destes que tinha saudades de adorar mais livros de poesia novos.
Acabei por admitir para mim mesma que me foi acontecendo o mesmo e que, por isso, andava a ler menos poesia. Irremediavelmente volto aos mesmos poetas que, de tão perfeitos, fazem-me decorar versos igualmente perfeitos.

Foi então que encontrei a Adília Lopes (através do Valter Hugo Mãe) e fiquei entre o impressionada e o emocionada com os afectos transformados em versos:


"Quantas vezes me fechei para chorar
na casa de banho da casa de minha avó
lavava os olhos com shampoo
e chorava
chorava por causa do shampoo
depois acabaram os shampoos
que faziam arder os olhos
no more tears disse Johnson & Johnson
as mães são filhas das filhas
e as filhas são mães das mães
uma mãe lava a cabeça da outra
e todas têm cabelos de crianças loiras
para chorar não podemos usar mais shampoo
e eu gostava de chorar a fio
e chorava
sem um desgosto sem uma dor sem um lenço
sem uma lágrima
fechada à chave na casa de banho
da casa da minha avó
onde além de mim só estava eu
também me fechava no guarda-vestidos
mas um guarda-vestidos não se pode fechar por dentro
nunca ninguém viu um vestido a chorar"


[se um dia escrevesse poesia, gostava de escrever assim]

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