31 janeiro, 2012

Hoje percebi que a minha orientadora também sabe dar elogios. Subtis, que quase só duram um segundo; se não tivermos atentos, o elogio escapa-se pelo tempo adentro. Este segundo soube particularmente bem depois de meses a tentar mostrar a minha perspectiva, a convencer que era este o caminho que tinha de fazer.

Num doutoramento este é um dos aspectos mais importantes: saber onde estamos e para onde queremos ir. E este não é um caminho isolado. Estamos juntos e faltam dois anos e dois meses.

A intensidade está a aumentar. Tenho um plano de escrita de artigos ambicioso; mas eu gosto de planos ambiciosos e estou pronta a cumpri-lo, nem que prescinda de horas de sono, de horas agarrada a livros, de horas a sugar séries (sim, voltei ao consumo diário de séries e não sei onde isto vai parar!).

A pressão está em cima de mim e agora sei que só vou deixar de a sentir no dia em que defender a tese. Este parece-me um dia tão longínquo que se torna irreal; mas na realidade está já ali e eu estou a preparar-me para esse mesmo dia.

27 janeiro, 2012

1Q84

Depois de ter lido, no final do ano passado, o "Kafka à beira-mar" do Murakami percebi que tinha de ler os livros todos do senhor. Acabei ontem de ler o "1Q84".

[sim, comecei pelo mais recente porque sou assim, gosto de desordem, voltas e reviravoltas]

Quando acabei a última página ainda não era meia-noite. Lavei os dentes, vesti o meu pijama da Mafalda e abri a janela só para confirmar se haveria ou não duas luas no céu. E com esta evidência assumo que as histórias do Murakami são mesmo viciativas.

25 janeiro, 2012

o nosso destino

Aqui há uns anos, não me lembro bem há quantos, li na revista Ler uma entrevista com o António Lobo Antunes que dizia que gostava desta terra. "Nós somos feios, pequenos, estúpidos, mas eu gosto disto", dizia ele.

Somos feios. Somos pequenos. Somos estúpidos.

Temos um sistema judicial que nos faz aclamar aos céus. Temos um sistema de saúde tão frágil como os meus miolos. Temos um sistema de educação (que me diz particularmente) em voltas e reviravoltas. E falar da política que temos é como ficar sem metáforas que a ilustre. Na rua vemos pessoas com a fatiota cuidada, com a pele a brilhar, mas muitas delas nem lêem um jornal. Nos cafés ouvimos falar da crise num tom carregado, como se não houvesse nada a fazer, como se fosse esse o nosso destino.

Apesar de feios (mas com fatiota cuidada), pequenos e estúpidos, há qualquer coisa que nos faz gostar desta terra. Só é pena que muitos se esqueçam disso mesmo: do que nos faz gostar desta terra. E que o digam com orgulho! Mas não, não dizem; não dizem porque é este o nosso destino.



[não admira que haja tantas pessoas a fugir deste nosso destino]

24 janeiro, 2012

Eu faço parte


| 21.01.2012 |
Abertura Oficial
Guimarães Capital Europeia da Cultura

































E este momento da história não podia ser mais perfeito para voltar a fotografar à séria.

20 janeiro, 2012

palavras catitas # 1

Há palavras que gosto de dizer, que são quase preferidas, que adoro repetir e desbundar.
Catita é uma delas ... não sei se tinham reparado, hum?

Mas há mais, daquelas que até precisam de um contexto e um cenário específico para serem utilizadas.  E é dessas que vou aqui apresentando, sempre que me lembre e sempre que não tenha mais nada de jeito para dizer.

Então a primeira palavra catita é ....
Chinfrim.


Se há palavra que tem sonoridade é esta. Quase que cada letra é uma nota musical.
E a menina adora!

19 janeiro, 2012


Cada vez que recebo feedback da minha orientadora sinto-me uma formiga sem miolos.

Se for em papel, está tudo riscado.
Se for em formato digital, só se vê destaques a amarelo e depois comentários com letras maiúsculas seguidas de pontos de exclamação e interrogação; e são tantos que parece que saem pelas margens.

Estou a hiperbolizar, mas a parte de me sentir sem miolos, é verdade.

quem ainda não leu este texto é casca de batata




Amor burguês

Havemos de engordar juntos.

Normalmente, toda a gente está demasiado preocupada em colocar a barra que diz "cliente seguinte", estão ansiosos, nervosos, têm medo que aquele que está à frente lhes leve os iogurtes, têm medo de pagar o fiambre daquele que está atrás. Enquanto não marcam essa divisão, não descansam. Depois, não descansam também, inventam outras maneiras de distrair-se. É por isso que poucos chegam a aperceber-se de que a verdadeira imagem do amor acontece na caixa do supermercado, naqueles minutos em que um está a pôr as compras no tapete rolante e, na outra ponta, o outro está a guardá-las nos sacos.

As canções e os poemas ignoram isto. Repetem campos, montanhas, praias, falésias, jardins, love, love, love, mas esse momento específico, na caixa do supermercado, tão justo e tão certo, é ignorado ostensivamente por todos os cantores e poetas românticos do mundo. Bem sei que há a crueza das lâmpadas fluorescentes, há o barulho das caixas registadoras, pim-pim-pim, há o barulho das moedas a caírem nas gavetas de plástico, há a musiquinha e os altifalantes: responsável da secção de produtos sazonais à caixa 12, responsável da secção de produtos sazonais à caixa 12; mas tudo isso, à volta, num plano secundário, só deveria servir para elevar mais ainda a grandeza nuclear desse momento.

É muito fácil confundir o banal com o precioso quando surgem simultâneos e quase sobrepostos. Essa é uma das mil razões que confirma a necessidade da experiência. Viver é muito diferente de ver viver. Ou seja, quando se está ao longe e se vê um casal na caixa do supermercado a dividir tarefas, há a possibilidade de se ser snob, crítico literário; quando se é parte desse casal, essa possibilidade não existe. Pelas mãos passam-nos as compras que escolhemos uma a uma e os instantes futuros que imaginámos durante essa escolha: quando estivermos a jantar, a tomar o pequeno-almoço, quando estivermos a pôr roupa suja na máquina, quando a outra pessoa estiver a lavar os dentes ou quando estivermos a lavar os dentes juntos, reflectidos pelo mesmo espelho, com a boca cheia de pasta de dentes, a comunicar por palavras de sílabas imperfeitas, como se tivéssemos uma deficiência na fala.

Ter alguém que saiba o pin do nosso cartão multibanco é um descanso na alma. Essa tranquilidade faz falta, abranda a velocidade do tempo para o nosso ritmo pessoal. É incompreensível que ninguém a cante.

As canções e os poemas ignoram tanto acerca do amor. Como se explica, por exemplo, que não falem dos serões a ver televisão no sofá? Não há explicação. O amor também é estar no sofá, tapados pela mesma manta, a ver séries más ou filmes maus. Talvez chova lá fora, talvez faça frio, não importa. O sofá é quentinho e fica mesmo à frente de um aparelho onde passam as séries e os filmes mais parvos que já se fizeram. Daqui a pouco começam as televendas, também servem.

Havemos de engordar juntos.

Estas situações de amor tornam-se claras, quase evidentes, depois de serem perdidas. Quando se teve e se perdeu, a falta de amor é atravessar sozinho os corredores do supermercado: um pão, um pacote de leite, uma embalagem de comida para aquecer no micro-ondas. Não é preciso carro ou cesto, não se justifica, carregam-se as compras nos braços. Depois, como não há vontade de voltar para a casa onde ninguém espera, procura-se durante muito tempo qualquer coisa que não se sabe o que é. Pelo caminho, vai-se comprando e chega-se à fila da caixa a equilibrar uma torre de formas aleatórias.

Quando se teve e se perdeu, a falta de amor é estar sozinho no sofá a mudar constantemente de canal, a ver cenas soltas de séries e filmes e, logo a seguir, a mudar de canal por não ter com quem comentá-las. Ou, pior ainda, é andar ao frio, atravessar a chuva, apenas porque se quer fugir daquele sofá.

E os amigos, quando sabem, não se surpreendem. Reagem como se soubessem desde sempre que tudo ia acabar assim. Ofendem a nossa memória.

Nós acreditávamos.

Havemos de engordar juntos, esse era o nosso sonho. Há alguns anos, depois de perder um sonho assim, pensaria que me restava continuar magro. Agora, neste tempo, acredito que me resta engordar sozinho.


José Luís Peixoto


18 janeiro, 2012

coisas que me fazem espécie

| as crónicas do Miguel Sousa Tavares | todo o bicho que rasteje | escrever palavras com k quando não é com k que se escrevem | verbos mal conjugados, do tipo, eu foi ou eu vou ir | a falta de tolerância ou a intolerância, com a diferença, com quem quer ser diferente, com quem faz coisas diferentes | o pessimismo ... só porque dizem que os portugueses são mesmo assim, como isso nos desse legitimidade para o sermos | a inércia, a apatia, a acomodação, que são acompanhadas por expressões como "é a vida!" | a política, que protege sempre os mais fortes | a falta de reconhecimento a quem merece | o cheiro da canela, para não falar do sabor | quando falam mal do Benfica sem razão | os preços dos livros (é por isso que depois perco a cabeça na fnac quando há promoções) | ....

e coisa e tal

17 janeiro, 2012

ler todos os livros do mundo

No início de um novo ano digo para mim mesma: "se a menina quer ler todos os livros do mundo, então tem de ler mais".

Em 2011 li muito, mesmo muito. Então BD foram pilhas até ao céu de páginas e livros - isto sou eu a hirperbolizar mas é que não consigo contar quantos livros de quadradinhos li e reli.

O meu problema é que quando gosto muito de um livro quase que não quero que acabe. Então, num epicurismo assumido, vou abrandando o ritmo, o folhear da página seguinte e assim fico. Mas, se a menina quer ler todos os livros do mundo ...

Estamos a depois de meio do primeiro mês do ano e já acabei o "Todos os Nomes" do Saramago e o "Wolverine: Inimigo do Estado 2". Comecei o novo do Murakami "1Q84"e o "Gotham Central: Book One".

Para o que vem a seguir, podem dar já sugestões: a menina que quer os livros todos do mundo não é esquisita, é pragmática: mesmo o que parece ser mau lê, assim dou uma opinião com conhecimento de causa.

Vamos lá saber ... o que ler em fevereiro?

welcome home, baby

Depois de tão prolongadas indecisões, capazes de me fazer os meus próprios neurónios fugirem, decidi-me pela D7000 com uma objectiva 18-105mm. Quando já estava preparada para avançar, diz-me o senhor, "não está disponível em nenhuma fnac". Ah, senti um treco a descer sobre mim. 

Esperei... Esperei... Esperei... 


Na semana passada, finalmente, fiz uma reserva e fui buscá-la. Curiosamente não me sentia a transpirar entusiasmo. Com uma passividade estóica dirigi-me ao balcão e disse para o que era. 

A menina (que mais tarde, em conversa, me confessou querer uma D90) chamou o segurança para ir buscar a máquina. Passaram por aquelas portas de "Acesso Reservado" e dali a uns minutos a menina que quer a D90 trazia-a nos braços. Foi nesse micro momento que a emoção tomou conta de mim. "É minha!", pensei eu. E voltei a repetir num silêncio secreto que era minha.
Ver se está tudo em ordem. Tratar do seguro. Fazer voar os euros da conta (nunca sairam tanto de uma vez). Conversa sobre fotografia. ... Numa ansiedade serena, peguei-a nos braços e trouxe-a para casa.

welcome home, baby!

[sim, continua a ser Bebé porque eu acredito que as minhas máquinas têm personalidade!]

07 janeiro, 2012

favorite things

| os livros, os que tenho e os que ainda não tenho | coisas que combinam | observar pessoas | as nuvens de Brasília | o mundo polar | os gelados de Itália | Wolverine | escrever nos cadernos das Papeleiras | música alta no carro |  desbundar na comida indiana | ouvir cantar fora do tempo | poemas do Pessoa | e também poemas da Sophia | fotografias do Michael Freeman | pão de queijo | preparar surpresas | ser surpreendida | bastidores do cinema, do teatro, dos concertos |  o relógio violeta | as ruas do Chiado | os rabelos no Douro | o Expresso ao sábado | a cerveja durante os jogos de futebol | os arrepios no Estádio da Luz | os concertos em que se dança | os afetos nos gestos | as expressões que saem do hipotálamo | os iogurtes naturais do Brasil (não há cá daqueles bons) | o bolo de noz que só se come no Natal | pataniscas | ideias que contagiam | o meu doutoramento | Star Wars (o meu Chewbacca!) |  happy hours |  caracóis no Verão | Transformers | o sol de Inverno | programas de culinária | o Kramer do Seinfeld | tarte de chocolate pimenta | Mai Tais | Pulp Fiction | o espelho da casa brilhante | os meus óculos Miu Miu | especiarias - coentros, manjericão, piri piri, pimenta rosa, caril, açafrão ... | o Mercado de San Miguel | revista Outras Coordenadas | dormitar no sofá | o céu cor-de-laranja brilhante com violeta | contagens decrescentes | | Serralves | pessoas que querem ser diferentes | palavras inventadas | cidades com movimento | conversas com versos ...


[e miles de outras coisas que não me estou a lembrar]

    

03 janeiro, 2012

o ano que ninguém quer

Terceiro dia do ano e já perdi a paciência para ouvir os fatores que tornam 2012 no ano que ninguém quer. A comunicação social parece estar a adorar isto, de tantas vezes que questiona economistas, professores catedráticos, consultores, e coisa e tal, se haveremos de sobreviver!

E ainda estamos no terceiro dia do ano... Tenho para mim que lá para fevereiro fico com urticária.

No meio da crise, do caos, do colapso e de todas as palavras que parecem começar pela letra c, perdem-se as coisas boas que vão acontecer, que nos tornam grandes, que nos tornam mais, que nos tornam diferentes.

Guimarães é a capital europeia da cultura.
Estaremos no europeu de futebol.
Livro editados e traduzidos.
Investigação a galopar.
Música que renova.
Fotografias que gravam a eternidade.
E outras coisas mais: as mais pequenas. as mais simples.

Mas parece que não é permitido falar com otimismo; não se enquadra com o país que temos.
Parece que não é permitido acreditar; não se enquadra com o país que temos.
Parece que não é permitido fazer; não se enquadra com o país que temos.

Qual é o país que temos?
Um país que eu vejo que pode ser mais do que palavras começadas pela letra c.